domingo, 27 de junho de 2010

A carta do marítimo de Olhão


Tratando-se uma das peças mais emblemáticas da "fala" de Olhão, terra ímpar nas história e cultura algarvias, publica-se a famosa carta que, tal como a foto, foi retirada do blogue APOS, um excelente trabalho de António Paula Brito em prol da sua terra.

"Farcisca
À díase, do mar dâse Berlêngase, a sete bráçase e mêa d' água, embararem-se-m' âze grósêrase, cande vê de lá o mariola do tê pai e me dezeu assim :
- Ó hôm!!! tu ése um montanhêre, hôm! Tu fázez um grande salcrafice em virese ó mar !!!...
- Má o que é que você me dize, hôm?!
- Digue-te iste e nã casase ca 'nha filha !
Alha-me-ze Farcizeca ! ê cá ântese cria cu tê pai me dèsse doi ó trê estragaços da cara, q'êl me dessesse aquil que tá ali à vizete de gente!

Viémese pá terra e a companha do barque nã falava doutra coisa.
Nísete, vê de lá o mane Zé Xaveca e me dezeu assim:
-Mó, ó móce! Na te zánguese, ná t' arráleze, móce! Taze-te arralar?
- Atão nã m´ êde arralar?
- Nã te ralese rapá, se nã casáreze c'a filha dele casaze cá c'a minha hôm!


É p'a que vêisase, Farcizeca, quê cá inda tenhe pretendêntase. Tu pensase cú tê pai é o Prencêse D.Carlos? A tua mãi a Rainha D. Imélia e os tês ermãos os Enlefantesinhos ?
Alhamese ! ele é mai brute cá mãi dos penhêrese do mane João Luice.

Dêxa lá cuma viage quê face ó mar de Larache , ganhe o denhêre às braçadase. Compre um chapé de côque, uma vengala, botas de rengedêra com tapadôiraze, passe a barlavante da tu porta e arraste os peses cóm' um gal. Tu vêse-me e falase-me, mai ê cá veje-te e nã te fale.

Mai, sê cá sentir alguma coisa do mê côrpe, ai 'nha mãe!!! Digue logue que forem vocêiaze que me fizerem mal! Qu'ê cá nã quér que vócêiaze andem a falar mal de mim p'êssese tânquese e rebêrese!

Ê bem sê que tu tenz' uma linda máineca de quez'tura, mai ê cá na sei s'èze tan prefêta de mãoze come dizeze.

Na m'arrale! Cá só quer que tu t'allêmbreze dos mês doze brenhoisinhes (ponha lá iste da carta,mano Manel, qu'ela já m'entende).

Digue tiste e nã memporta com o pôrque do tê pai.
Perdoi a arção.

Embróise"

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Poesia amável


Com dedicatória especial ao meu amigo Afonso Dias, aqui vai um poema da Hélia Correia

Só assim será poema

Que o poema tenha carne
ossos vísceras destino
que seja pedra e alarme
ou mãos sujas de menino.

Que venha corpo e amante
e de amante seja irmão
que seja urgente e instante
como um instante de pão.

Só assim será poema
só assim será razaão
só assim te vale a pena
passá-lo de mão em mão.

Que seja rua ou ternura
tempestade ou manhã clara
seja arado e aventura
fábrica terra e seara.

Que traga rugas e vinho
berços máquinas luar
que faça um barco de pinho
e deite as armas ao mar.

Só assim será poema
só assim será razão
só assim te vale a pena
passá-lo de mão em mão.


Hélia Correia é mais conhecida como ficcionista, mas que está incluida na Antologia Poesia 71, de Fiama Pais Brandão, lá isso está; que José Fanha a incluiu na sua Antologia Poética da Resistência, é verdade; que Mafalda Arnaut, Vitorino, Amélia Muje, Cristina Branco, Janita Salomé,José Jorge Letria e o GAC(Viva a Ronda da Alegria), entre outros a cantaram, é certo; que esteve quase a ganhar o prémio Camões pelo ecletismo da sua obra - ficção, poesia e teatro- também é verdade.

Do seu livro de poesia Pequena Morte/Esse Eterno Retorno - 1986

Contigo partilhei
os vários leitos dos amigos dispersos. Mesas, sumos,
os degraus mal ardidos do terror.
Contigo um pouco em cada aldeia, enquanto
nada de nós podia ultrapassar
as paredes dos outros que jaziam
no repouso ......

Que o Caló embeleze o post, que para isso não tenho arte.

Augusto Miranda

domingo, 20 de junho de 2010

José Saramago e o conflito com Deus



"Entre o homem, com a sua razão, e os animais, com o seu instinto, quem, afinal, estará mais bem dotado para o governo da vida? Se os cães tivessem inventado um deus, brigariam por diferenças de opinião quanto ao nome a dar-lhe, Perdigueiro fosse, ou Lobo-d'Alsácia? E, no caso de estarem de acordo quanto ao apelativo, andariam, gerações após gerações, a morder-se mutuamente por causa da forma das orelhas ou do tufado da cauda do seu canino deus?" (José Saramago - In Nomine Dei).

A existência de deus e do seu poder e veículos de comunicação com o homem, questão pertinente, sempre actual, e recorrente na vida e obra de José Saramago (leia-se José Saramago em abordagem directa, em, "Segunda Vida de Francisco de Assis"; "Evangelho segundo Jesus Cristo"; "In Nomine Dei"; "Caim").

As minhas homenagens a este grande e vertical pensador, escritor e homem.

Tertuliano Jorge Leiria

sábado, 19 de junho de 2010

A Selecção Nacional, os caracóis e o Futebol Clube "O Victória"




Tinha visto as cores verde rubras arrastarem-se lentamente, sem chama e sem ímpeto contra os elefantes da costa do marfim. Quedei-me desiludido e pachorrento e ocorreu-me a imagem dos caracóis. Quem igualmente o pensou, melhor o disse. Eis senão quando o amigo Chico Zé (na foto) telefona e convida para ir comer dos ditos gastrópodes à sociedade recreativa mais emblemática do Alto de Rodes, na companhia do tio Américo.
Magníficos, trazendo à memória aquilo que era a referência da caracolada ao fim da tarde - o quintal da tia Margarida no Monte Negro! Estes, também dos nossos, apanhados no restolho, deixados de quarentena (para tirar algum resto de verdum), lavados em várias águas, removidos os mortos (para não deixarem mau gosto), temperados a perceito de sal, alho, limão e paus de oregãos (já que o excesso de folhas do arbusto os tornam amargosos) e acolitados com umas batatinhas novas cozidas na aguagem, como berlindes, a dar o ar da sua graça.


Vetusta e venerável agremiação fundada em 1931 (imagem ao lado), também designada pelas pessoas do bairo como a CUF, por ter pretendido ser ou tendo sido mesmo sucursal da CUF do Barreiro, promoveu ao longo dos anos festas populares no largo do chafariz (imagem abaixo) e mantém uma respeitável actividade de apoio social à comunidade do bairro, que procura ocupar o seu tempo com um petisco, um jogo de cartas ou umas imagens de televisão, numa tertúlia amável, fraterna e bairrista.

Longos anos de vida ao Futebol Clube "O Victória", boas caracoladas e, valha-nos Deus, boa sorte às cores verde rubras:
Tertuliano Jorge Leiria

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Hino da Adega foi ontem para o prego


Dada a circuntância de não haver pompa, foi a singeleza a imperar na colocação do Hino nas nobres paredes do edfício-sede da Tertúlia. Descerrou o quadro, onde pode ser lido e apreciado o poema, o Taberneiro Mor, João Domingos.
A peça que, foi mandada executar pelo tertuliano Miranda, prima pela sobriedade dos tons, onde se destaca o verde de uma moldura clássica, que acolhe a letra do Hino da Adega Amável, escrito em letra Verdana, tamanho 14, com espaçamento 1,5 nas suas linhas, sobre papel pardo reciclado.
Presidiu à cerimónia o Tertuliano Leiria, como mais antigo frequentador daquele espaço.
O Taberneiro Mor proferiu algumas palavras alusivas ao acto, deixando-se trair pela emoção que o assaltou, não conseguindo disfarçar um certo embargo na voz nem ocultar umas caganitas que lhe saltaram aos olhos.
A marcar o evento, uma excelente petiscada: saladinhas de polvo e de orelha de porco, feitas a preceito e, como conduto principal, uns fabulosos carapauzinhos fritos acompanhados por uma canónica tomatada.
Bebeu-se espumante: Bruto Rosé Luis Pato (casta baga) e um Bruto Branco Casas de Monção (casta alvarinho).
Bebeu-se um verde caseiro de Felgueiras (casta gadelhudo), trazido pelo tertuliano com o mesmo nome (Felgueiras, não gadelhudo!)
Como não podia deixar de ser, o supertinto também marcou presença no canjirão da murraça.
Presentes ainda os que fazem falta, os habituais e os outros.
Cantou-se o Hino, com muitos bis.
Bem hajam!
Tertuliano Caló

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Ainda dentro via verde


Comenta o tertuliano Felgueiras que, cumpridas as condições objectivas e subjectivas, apresentará pomada semelhante ao "gadelhudo" trazido ao nosso convívio pelo confrade Miranda. Das duas, três! Ou foi motivado pela notícia, ou já o tinha mas estava com medo de não brilhar, ou está a "blefar"! Fica desde já OBRIGADO a apresentar a dita pomada, INDEPENDENTEMENTE da ementa! Isto aqui não é nenhum cruzeiro de luxo! Nem que seja apenas para acompanhar as "zêtonas" do tertuliano Grosso, por sinal EXCEPCIONAIS, e acabadas! Até porque nunca há desculpas para adiar uma boa pinga!

Mundial 2010


"rebola a bola lá de cima do telhado o macaco deu um pêdo fez rachar o tabuado"
(memórias dos ditos escola primária de S.Luis, na mais sublime inocência infantil, por Tatos Cabeça de Pão Caseiro, filho de Garrochinho filho (árbitro) e Garrochinho pai, ambos trabalhando juntos, com barbearia montada na rua do Alportel em frente à saudosa Taberna do Belchior - anos 1955-56-57)
Tertuliano Leiria

Falta dizer que no beco (então ruela) por trás da barbearia, a meio, mesmo em frente ao recreio da escola do carmo (onde andei os 4 anos da primária)havia a casa da Bêçuda, rameira de 4ªa categoria. As vezes assistíamos a cenas de desesperadas donas de casa, que invadiam o beco invectivando a pobre, responsabilizando-a pela galdeirice dos inocentes maridos. Isto a meio de um jogo de "belindre" às três covinhas ou de piâo à "cantada".
Tertuliano Caló
Nota: Um dia destes, porque se enquadra no espírito da nossa "coisa", publico o Fado da Lózinha, autêntico "rallye paper" das casas de passe de Faro, anteriores à sua proibição (1961). Enquadra-se porque é um fado, que há-de ser cantado uma qualquer próxima 4ª feira.Seu autor: o enorme Prof. Franklin!

domingo, 13 de junho de 2010

Campeonato do Mundo


Dos candidatos, a ter valido a pena ver jogar, até agora, só a Alemanha.

Azal Branco



A propósito do belo refresco que o tertuliano Miranda apresentou à mesa na passada quartafeira, venho informar que se trata de uma "casta branca de qualidade, recomendada nas Sub-Região de Basto, Penafiel e Amarante e nos concelhos (6) mais a sul da Região Demarcada. Muito produtiva e rústica. Dá origem a vinhos de aroma delicado mas pouco intenso, ligeiramente acídulos e afrutados."
Também é conhecida por «Asal da Lixa» em Amarante, «Gadelhudo» em Felgueiras, «(Es) Pinheira» em Lousada e ainda por «Carvalhal»
E já agora, também uma questão para o nosso amável tertuliante: é verdade que terá sido o vinho verde o primeiro vinho português conhecido nos mercados europeus (Inglaterra, Flandres e Alemanha), principalmente os da região de Monção e da Ribeira de Lima?

Como o Fado começou a ser cantado de pé


Ao tertuliano e especialista Afonso Dias, para que corrobore ou contradiga esta referência do Blogue "Alfredo Marceneiro"

"Estávamos no tempo do cinema mudo e os primeiros empresários que contrataram Alfredo Marceneiro foram Artur Emauz e Vicente Alcântara, para o Chiado Terrasse, no propósito de este cantar nos intervalos das exibições cinematográficas, pois o público andava arredado dos espectáculos da 7ª. Arte.
Alfredo Marceneiro e Júlio Proença estavam no auge das suas carreiras, razão pela qual o público começou a acorrer em maior número ao cinema.
Assim, além de assistir ao filme, também ouviam cantar o Fado.
Estes contratos no Chiado Terrasse tiveram um duplo benefício: o aumento das receitas do cinema e a possibilidade de um contacto mais próximo do grande público com os fadistas, que tinham fama de indivíduos de mau porte, o que permitiu a desmistificação dessa ideia de raízes tão perdidas no tempo.
Na sequência destas suas actuações no Chiado Terrasse, Alfredo Marceneiro, que já tinha criado o hábito de se cantar o fado à média luz, tem um dos seus repentes de criatividade e levanta-se para cantar o Fado.
Até esta altura todos os fadistas cantavam sentados e os espectadores mais distantes tinham a tendência de se levantarem, a fim de poderem ver quem estava a actuar. Isto provocava um certo burburinho, que prejudicava as actuações e, com esta atitude de Alfredo Marceneiro, o Fado ganhou outro respeito. A partir desse dia os tocadores e os fadistas passaram a ter um lugar de destaque nas salas onde actuavam e o Fado começou a ser cantado com o fadista de pé."

O estranho caso do misterioso Nani

Não sendo propriamente o "Doutor Ossos", o meu conhecimento empírico questiona-me porque é que uma fractura (ou fissura) na clavícula (ou na omoplata), demora tanto tempo a diagnosticar - com radriografias, ecografias e uma panóplia de ferramentas actualmente disponíveis, sobretudo para atletas de alta competição pagos a peso de ouro. Mais, questiona-me porque é que uma fractura (ou fissura) não é imediatamente imobilizada, ao contrário do que as imagens que até agora se seguiram ao incidente evidenciam.

sábado, 12 de junho de 2010

Frase do dia- Georges Bernanos


Aos pinguços residentes, Jorge (pára)- na foto- e Maurício (matacães)

*
O pobre prefere um copo de vinho a um pão, porque o estômago da miséria precisa mais de ilusões que de alimento

Tendo prometido voltar ao assunto, aqui vão mais alguns letreiros curiosos, da mesma fonte, sobre:

*

* *
"Barbeiros, Dentistas, Sangradores e Guitarristas! Chegamos a este capítulo! Não se admire leitor da mistura. Era raro o barbeiro que não fosse sangrador e dentista, como era raro o que não tocasse guitarra. A guitarra era tão própria da profissão como a noz que o freguês metia na boca para opôr a bochecha às carícias da lâmina afiada, se êste não preferia o dedo respondendo à pergunta sacramental:
- Quere noz ou dedo?
O que isto nos arripia agora, cercados como estamos de pulverizadores, pincéis, máquinas eléctricas, cadeiras móveis, alúmens,, cosméticos e essências. A banha, o dedo, o mocho de assentar, em tendas infectas, parecem-nos agora sucursais da Inquisição.
O barbeiro, assim como tinha a guitarra acantoada na loja, em que dedilhava, à porta, na míngua de fregueses, tinha fora dela erguida a vara pintada de azul e branco, simbolo das ataduras da sangria, e quanta vez o frasco das sanguessugas a-par da mecha de cabelo e da bacia de sangrar golpeada na aba.
Lá dentro o mesmo utensílio, feito no Rato ou na Bica do Çapato, decorado com flores, aguardava entre as toalhas de franja, o freguês de qualidade ou a chamada a casa do fidalgo que havia mister de pontear de vermelho a polpa do braço.
Mestre lhe chamavam uns; oficial, outros. António Maria Couto fez larga colheita de letreiros nesta classe, cujo pitoresco tem resistido a tudo.
O barbeiro é sempre uma figura típica. No seu tempo - a avaliar pelo que diz o autor de Schetches of portuguese Life and Manners, Costume and Character - devia de havê-los dos bons.
Corramos a lista dos que estropiaram as taboletas, e mereceram o reparo do Taful.
Primeiro três provas das multiplas aptidões dêstes artistas.
A Santa Luzia estava estabelecido

*

José Barbosa da Costa Dentista Luzitano, sangrador e barbeiro aprovado

*
Na Travessa da Palha lia-se a seguinte a seguinte legenda

*

Bichas de boa casta e pegadiças Barbear, corta cabellos, faz barbas por cazas particulares, sangra e aplica remédios

*
e, noutro ponto da cidade:

*

Joaquim António da Silva Ribeiro Mestre barbeiro de pentear, e barbear, e de amollar toda a qualidade de ferramenta viveiro de bichas

Tho shave dress the hair

*
O ofício de amolador também era acumulado pela profissão. Na Bica do Çapato lia-se

*

Aqui samolla*

e era um barbeiro também.
Quanto a bichas, a variedade anunciada era considerável. Um barbeiro, na casa dos Padres Vicentes, junto à Praça de Figueira, tinha

*

bixas ferozes e pordentes(!)

*
para todos os paladares; outro, ao fim da Tapada de Alcântara, anunciava pleonàsticamente

*

Bixas para doentes

*
um terceiro,aos Olivais, reclamava

*

Bixas do Rio*

e ainda havia outro que possuía a seguinte especialidade:

*

Bixas excelentíssimas para Senhoras

*
que poderia ter, cortêsmente, modificado em

*

Excelentíssimas bichas para excelentíssimas Senhoras

*
Galante barbeiro!
Para quem tivesse pressa havia, na travessa do Arco do Cego, um

*

Barbeiro expedito

*
um que era bom e aceado ao Arco da Graça, outro que dizia pentear e fazer a barba separado (nada de misturas), um que fazia crescentes para os calvos, no Rossio, e outros que, àparte as barbas, vendiam pós de Lubeck, vinho do Porto e pomadas de cheiro.
Como sangradores reclamavam-se alguns. Havia, defronte do Hospital de S. José, entre as insígnias do ofício, o letreiro de

*

Sangrador iminente

*
de cuja "iminência" livrasse Deus os necessitados, e outro que pertencia a um barbeiro-dentista-cirurgião que vendia as "pílulas de família" que se faziam no Porto.
À Lapa, o barbeiro José Moreira Duarte levantava espinhelas caídas; à Guia era a

*

Assistencia do famoso

Dentista Pires

*
como dizia um painel pôsto à janela com immodesta expressão; na rua dos Correiros era o

*

Dentista Estrange

*
a quem se faltavam letras não faltava naturalmente a freguesia; e perto de S. Paulo o "professor Dentista João Rodrigues da Cruz", que anunciava, como chamariz, ser sobrinho do defunto Manoel da Cruz. Ex*elente recomendação.
O dentista Meirel, que tinha na taboleta, na sua residência, à Lapa:

*

Tira dentes

Meirel

E acautella com remédios os

combalidos

*
mereceu a Bocage o seguinte improviso, feito a um seu consulente:

*

Do Meirel formas querela

Porque os dentes te dispensa?

Não t'os tirou por doença

Tirou-t'os só por cautela

Bem atalha quem bem pensa

*
O desgraçado apenas tomara a mistela do Meirel ficara logo desdentado.
Quero ainda acrescentar o letreiro de um guitarrista que havia na rua de Inveja. Dizia assim:

*

Fabrica de cordas de viola e de rabeca para rabecam, e bordões para chapéus, e de todas as côres, e guitarrras

*
Outro no Bairro Alto, era desta forma:

*

Tocador de guitarra,

dá licções por dinheiro

a todos que o convócão

*
E foi o que achei nos Letreiros Célebres à conta desta verbosíssima classe."

*

* *

Voltarei à carga com outros letreiros curiosos.

Saudações.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Pensamento do Dia

Quando deixará de ser necessário dizer que os que são contra as bebidas alcoólicas são doentes ameaçados por esse veneno que é a água, tão dissolvente e corrosivo que o escolheram, entre todas as substâncias, para as abluções e barrelas?
Alfred Jarry

Ainda a propósito do Dia dito de Portugal


Maior que a chatice das restrições ao direito de livre trânsito nas nossas ruas ou de termos que apanhar com exibições de poderio militar que toda a gente sabe que não vale um chavo, foi ficar a saber (já que, por motivos terapêuticos, não assistimos) das encomendas que foram "merdalhadas" e feitas comendadores. Haja decência! Terei que dar razão ao desbocado Alberto Jardim? Quem decide neste país é a Opus Dei, a Opus Gay e a Maçonaria?
Assim, com maiúsculas, para vos custar mais a engolir!

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Frase do dia - Charles Baudelaire

"É preciso estar sempre embriagado. Para não sentirem o fardo incrível do tempo, que verga e inclina para a terra, é preciso que se embriaguem sem descanso. Com quê? Com vinho, poesia ou virtude, a escolher. Mas embriaguem-se."

9 de Junho - Tertúlia Amável, Adega Amável, sempre!

De pé oh vítimas da sede
que por desígnios de políticos de feira
Tentaram de forma vil e matreira
Impedir-nos, enlear-n0s numa rede
Alí, onde o tempo não se mede
Contra os submarinos do Portas
Desmontando linhas tortas
E a mais urdida cabala
Até contra a lei da bala
Alí
Beberemos e cantaremos a horas mortas

Tertuliano Jorge Leiria



Em:
"Relação de vários casos notáveis e curiosos sucedidos em tempo na cidade de Lisboa e em outras terras de Portugal, agora reunidos, comentados e dados à luz por Gustavo de Matos Sequeira, olissiponense, editado em Coimbra na Imprensa da Universidade, com todas as licenças necessárias, no ano de MDCCCCXXV"
*
* *
"As casas de vinho, tabernas e botequins, sucessoras em Lisboa das que Gil Vicente menciona no "Pranto de Maria Parda" dão larga contribuição a este livro.
Em 1806 abundava êste género de estabelecimentos, a cuja tablilha se encostava a freguesia de guela sêca, a avaliar pela soma considerável daquêles quederam no goto do professor do Colégio de Belém, vizinho talcez do Techugo, que era uma das apregoadas casas de comer daquêle sítio.
Havia o convite pagão de folia fúnebre para os carpideiros da praxe, como naquela taberna no caminho para o alto de S. João, com a famosa legenda de
*
Reparem à ida, à volta cá os espero
*
Havia as que apregoavam as virtudes miríficas da bebida, como o botequim da rua da Conceição que tinha escrito ao alto:
*
os generos desta casa convidam
aos que tem gosto e entram nela,
*
ou a taberna ao Campo de Santana onde se lia:
*
Loja de bebida. Destingue-se
pela garrafa e pelo copo
*
e o copo e a garrafa lá apareciam pintados.
Havia o que roubava ao vinho a qualidade de líquido
*
Bom vinho para comer
*
Na Ribeira Nova, outra taberna reclamava-se pondo na taboleta
*
Diversidade geral de Vinhos
*
e no cais do Sodré, dentro de um armazém com as paredes revestidas de garrafas, lia-se
*
Biblioteca Universal de Licores
*
o que era um tentador letreiro para os bibliófilos da especialidade.
Havia os que poetavam nos letreiros
*
Comer bem e beber melhor
He só proprio de quem tem valor
*
ou êste, também na Ribeira Nova, que, antepassado do conhecido anúncio da "ginjinha"
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He mais facil com a mão
dez estrelas agarrar
*
ou do que se admirava num quadro no antigo cambista da Rua do Oiro, João Cândido da Silva, pintava sôbre a porta saindo da boca de um marujo, esta legenda, que o "Tratado da Metrificação" de Castilho não aprovaria de-certo:
*
Nada alegra o espírito
Como o licor de Baco
Não importa que suba ao caco
O que he bom deve tomar-se
Beber até emborrachar-se
E tomando assim gosto ao Vinho
Dorme-se como um santinho.
*
Na rua da Paz havia Licores femininos (?), em Arroios os Licores Pilatos (?), no Conde Barão os Licores bonnes, em Alfama os Licores gerais, a S. Domingos o Licor da Moda, ao Erário Novo os Licores inumeráveis, defronte do Correio os Licores franceses, e no Rossio, além da Sorveja de diversas bebidas, que devia ser raro ingrediente, anunciava-se Champurrião, Cró e Fillipina bem feita.
Na rua da Condessa escrevia-se na bandeira de uma porta
*
Chaffé, Liquore, Sceriveja
*
que se a qualidade correspondesse à ortografia, deviam de ser bastante indigestas; e a S. Roque decorava-se um botequim, ao pé da tasca apelidada de Casa do Bom Despacho com êsta admirável letreiro:
*
Bubidas, dosses, CKappilée!
*
Nunca o pacatíssimo e inocente capilé teve tão brilhante e complicada exibição gráfica. Parece húngaro!
O "Taful de luneta" ainda pôde ler um
*
Quem quiser, entre
*
numa taberna da Travessa das Almas, uma
*
Casa para Senhoras
*
num botequim a S. Cristóvão, uma
*
Casa de Prazer e Alegria
*
na rua do Norte, e uma
*
Taberna bôa em preço
*
no Terreiro do Paço.
Alguns botequineiros usavem o latim. Sempre dava um certo ar.
Ao Passeio Público lia-se
*
Hic quod bonum est intrinsecus videtur
Thesaurus liquoroum & potiorum admirabilium
*
na rua do Mercatudo
*
Aditus hic salutaris
*
Aos Poiais de S. Bento
*
Bibere sina metu intra & videbis
*
às Janelas Verdes
*
Laeticiam vinum proebet
Primus in orbe Bacchus
Et proprimis hic Dionusus
De se ideam donat (?)
*
e noutro alambique
*
Nec semper alta valebunt
Parva saepe meliora.
*
O café aqui é digno de Cícero!
O francês também foi usado
*
L'union ou l'on mange, et l'on boit
*
Era uma taberna defronte da Casa da Moeda.
A Buenos Aires havia uma pitoresca taboleta onde estava escrito
*
Entre as mais coisas sardinhas feitas para o selectivo Baccho que se acha de venda por dinheiro
*
donde legitimamente se inferia que o deus se vendia ao balcão a meios quartilhos a-pesar-de selectivo.
Ao Rato avisava-se noutro letreiro com parcimónica cautela
*
Aqui se administram bebidas com toda a sisudeza
*
em oposição ao que proclamava na estrada da Penha de França
*
Aqui se tomam borracheiras mestras
*
ou à sinceridade do taberneiro da Cruz da Pedra que mandara pintar na taboleta
*
Bebidas para sustentar o vício
*
Uma tasca no cais do Santarém não estava também com acanhamentos nem usava de subterfúgios anunciando
*
Que guapa cousa! Ninguém quer do meu vinho? Elle não he mau, nem embebeda senão a quem lhe toma o gosto.
*
Em boa ordem, espírito prático, nenhum dêstes letereiros leva as lampas, todavia, ao que estadeava em Alcântara, na ruazinha que do largo descia para a praia, ali perto da Trabuqueta.
Veja o leitor:
*
Os mandamentos desta casa são cinco: o primeiro he entrar, o segundo aviar, o terceiro pedir, o quarto pagar e o quinto marchar
*
É um programa completo, como quem diz: será sangue, mas o tempo é dinheiro.
Também na rua dos Cavaleiros se via uma legenda semelhante
*
De comer
pedir
pagar
e andar
*
no género da que hoje vemos em quatro insígnias salientes num estabelecimento de artigos eléctricos da Baixa
*
Sede benvindos
Não hesiteis
Temos de tudo
Agradecidos
*
Outros letreiros valém uma transcrição.
Ao Poço do Bispo:
*
Vinho sem ser de oudre (!)
*
na rua de Boaventura:
*
Bella cousa he beber vinho
*
Na Calçada da Estrela:
*
Armazém sem contracção
Comerese agurdente.
*
Quem se contraíu foi o pintor, que teve de comer sílabas e letras.
Perdoemos-lhe todos"
*
* *
Voltarei a este assunto.
Saudações.

O vento, o mar e o vinho



Do saudoso e descansado amigo Penisga (reforço a pergunta: não andará já por aí novamente?):

O vento não sopra ..., O mar não urra ...,

Caí no chão! Quem é que me empurra?

O vinho é cão!!!

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Ainda a propósito de tabernas


Pegando nas palavras do tertuliano Miranda, alargaria a colaboração ao tertuliano Leirudo, na prospeção do espólio literário do saudoso Penisga, um "expert" em histórias de petiscos e tabernas.
Através da Tertúlia Amável dar-se-iam a conhecer estas estórias, pela mão invisível da blogosfera, quiçá frequentada alegremente pelo nosso Penisga (se não andar já por aí de volta...).
A propósito, numa antiga taberna ali próximo de onde se cruzam as ruas Cruz das Mestras e Horta Machado, a taberna do Treme Treme, havia as seguintes quadras inscritas na parede, da autoria de algum cliente com veia versejadora:

Treme Treme, faço saber/ É o nome que a casa tem/ Mas beba o que beber/ Aqui não treme ninguém.

Ao voltar para casa/ Quando à noite daqui saio/ Posso ir ferido de asa/ Mas cair é que não caio!

Nota: Na foto um pormenor de uma parede da nossa sede, a Adega Amável

Tabernas e património cultural


No "Diário de Notícias" de 5 de Junho, glorioso dia de anos da minha filhota Ana, nas Alegações Finais, um grande título diz que " Há que recuperar a ida dos nossos intelectuais às tabernas". O entrevistado é Paulino M. Tavares, fundador do Centro de Estudos Inesianos e da Liga dos Amigos das Tabernas Antigas. Aí se fala das tabernas de pau de loureiro à porta e de garrafão de vinho à entrada. Aí se fala de um roteiro de tabernas de Grândola. Que tal Afonso, Caló, Bons Ofícios conhecermos e dar a conhecer as tabernas que por Faro ainda existem. Tabernas e espaços onde o petisco tradicional é rei. Ao fim e ao cabo, repositórios de tanta tradição que importa preservar e divulgar.
Na próxima sessão, com o "camisinha" e nova garrafa "Azal", branco, o artigo estará presente, para a provocação que importa apresentar.
Abraço tertuliante.
Nota: Na foto uma taberna alentejana. "Nem os padres dispensavam uma ida à taberna. Camilo, Eça, Antero também não." - disse o entrevistado.

domingo, 6 de junho de 2010

Assim não gosto de você leãozinho!


Hoje o meu Sportinguinho (juniores) baqueou frente aos batanetes (0-2). Até onde fomos tradicionalmente mais fortes começamos a borregar. Mas pior que a derrota foi não vislumbrar grandes promessas naquela equipa, com excepção do defesa central.

Amável Barlavento


Regressei de um retiro espiritual na costa (sul) vicentina. Notas gastronómicas a merecerem destaque: a imbatível salada de polvo na Ribeira do Poço (Vila do Bispo), onde ainda se debicou uma moreia frita extraordinária (saborosa, e estaladiça como manda a lei) e uns mexilhões de lamber os dedos. Selou a refeição uma posta de anchova dos mares locais, grelhada no carvão.
Um branquinho da Peceguina refrescou-me a alma.
Já no que diz respeito à gastronomia "home made", tive que me contentar, face à escassez de pescado, com uma caldeiradazita de rascaço. Do caldo e dos restos, avançou-se para o histórico xerém. Acompanhou o honestíssimo Barranco Longo branco. A mesma marca, versão Rosé, ajudaram a deglutir dois quilitos de percebes acabadinhos de serem apanhados.
Onde é que pára a crise?

terça-feira, 1 de junho de 2010

Portugal pronto para Mundial


Podem repetir até mais não que os nossos jogadores provêm de uma boa colheita. O problema é que boas uvas não chegam para fazer um bom vinho. O jogo de hoje mostrou que Deco tem aroma mas não tem corpo (fôlego para 90 minutos), Ronaldo tem bom corpo e aroma mas falta-lhe alma (para a selecção) e os outros bebem-se. Nani, se não for engarrafado já por causa do Simão, será talvez o que evoluirá melhor. Mas o povo gosta, e isso é que conta.

Até final de Junho não há PEC que nos tire do sofá!