quarta-feira, 9 de junho de 2010



Em:
"Relação de vários casos notáveis e curiosos sucedidos em tempo na cidade de Lisboa e em outras terras de Portugal, agora reunidos, comentados e dados à luz por Gustavo de Matos Sequeira, olissiponense, editado em Coimbra na Imprensa da Universidade, com todas as licenças necessárias, no ano de MDCCCCXXV"
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"As casas de vinho, tabernas e botequins, sucessoras em Lisboa das que Gil Vicente menciona no "Pranto de Maria Parda" dão larga contribuição a este livro.
Em 1806 abundava êste género de estabelecimentos, a cuja tablilha se encostava a freguesia de guela sêca, a avaliar pela soma considerável daquêles quederam no goto do professor do Colégio de Belém, vizinho talcez do Techugo, que era uma das apregoadas casas de comer daquêle sítio.
Havia o convite pagão de folia fúnebre para os carpideiros da praxe, como naquela taberna no caminho para o alto de S. João, com a famosa legenda de
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Reparem à ida, à volta cá os espero
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Havia as que apregoavam as virtudes miríficas da bebida, como o botequim da rua da Conceição que tinha escrito ao alto:
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os generos desta casa convidam
aos que tem gosto e entram nela,
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ou a taberna ao Campo de Santana onde se lia:
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Loja de bebida. Destingue-se
pela garrafa e pelo copo
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e o copo e a garrafa lá apareciam pintados.
Havia o que roubava ao vinho a qualidade de líquido
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Bom vinho para comer
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Na Ribeira Nova, outra taberna reclamava-se pondo na taboleta
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Diversidade geral de Vinhos
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e no cais do Sodré, dentro de um armazém com as paredes revestidas de garrafas, lia-se
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Biblioteca Universal de Licores
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o que era um tentador letreiro para os bibliófilos da especialidade.
Havia os que poetavam nos letreiros
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Comer bem e beber melhor
He só proprio de quem tem valor
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ou êste, também na Ribeira Nova, que, antepassado do conhecido anúncio da "ginjinha"
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He mais facil com a mão
dez estrelas agarrar
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ou do que se admirava num quadro no antigo cambista da Rua do Oiro, João Cândido da Silva, pintava sôbre a porta saindo da boca de um marujo, esta legenda, que o "Tratado da Metrificação" de Castilho não aprovaria de-certo:
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Nada alegra o espírito
Como o licor de Baco
Não importa que suba ao caco
O que he bom deve tomar-se
Beber até emborrachar-se
E tomando assim gosto ao Vinho
Dorme-se como um santinho.
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Na rua da Paz havia Licores femininos (?), em Arroios os Licores Pilatos (?), no Conde Barão os Licores bonnes, em Alfama os Licores gerais, a S. Domingos o Licor da Moda, ao Erário Novo os Licores inumeráveis, defronte do Correio os Licores franceses, e no Rossio, além da Sorveja de diversas bebidas, que devia ser raro ingrediente, anunciava-se Champurrião, Cró e Fillipina bem feita.
Na rua da Condessa escrevia-se na bandeira de uma porta
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Chaffé, Liquore, Sceriveja
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que se a qualidade correspondesse à ortografia, deviam de ser bastante indigestas; e a S. Roque decorava-se um botequim, ao pé da tasca apelidada de Casa do Bom Despacho com êsta admirável letreiro:
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Bubidas, dosses, CKappilée!
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Nunca o pacatíssimo e inocente capilé teve tão brilhante e complicada exibição gráfica. Parece húngaro!
O "Taful de luneta" ainda pôde ler um
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Quem quiser, entre
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numa taberna da Travessa das Almas, uma
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Casa para Senhoras
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num botequim a S. Cristóvão, uma
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Casa de Prazer e Alegria
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na rua do Norte, e uma
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Taberna bôa em preço
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no Terreiro do Paço.
Alguns botequineiros usavem o latim. Sempre dava um certo ar.
Ao Passeio Público lia-se
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Hic quod bonum est intrinsecus videtur
Thesaurus liquoroum & potiorum admirabilium
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na rua do Mercatudo
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Aditus hic salutaris
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Aos Poiais de S. Bento
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Bibere sina metu intra & videbis
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às Janelas Verdes
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Laeticiam vinum proebet
Primus in orbe Bacchus
Et proprimis hic Dionusus
De se ideam donat (?)
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e noutro alambique
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Nec semper alta valebunt
Parva saepe meliora.
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O café aqui é digno de Cícero!
O francês também foi usado
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L'union ou l'on mange, et l'on boit
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Era uma taberna defronte da Casa da Moeda.
A Buenos Aires havia uma pitoresca taboleta onde estava escrito
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Entre as mais coisas sardinhas feitas para o selectivo Baccho que se acha de venda por dinheiro
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donde legitimamente se inferia que o deus se vendia ao balcão a meios quartilhos a-pesar-de selectivo.
Ao Rato avisava-se noutro letreiro com parcimónica cautela
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Aqui se administram bebidas com toda a sisudeza
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em oposição ao que proclamava na estrada da Penha de França
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Aqui se tomam borracheiras mestras
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ou à sinceridade do taberneiro da Cruz da Pedra que mandara pintar na taboleta
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Bebidas para sustentar o vício
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Uma tasca no cais do Santarém não estava também com acanhamentos nem usava de subterfúgios anunciando
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Que guapa cousa! Ninguém quer do meu vinho? Elle não he mau, nem embebeda senão a quem lhe toma o gosto.
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Em boa ordem, espírito prático, nenhum dêstes letereiros leva as lampas, todavia, ao que estadeava em Alcântara, na ruazinha que do largo descia para a praia, ali perto da Trabuqueta.
Veja o leitor:
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Os mandamentos desta casa são cinco: o primeiro he entrar, o segundo aviar, o terceiro pedir, o quarto pagar e o quinto marchar
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É um programa completo, como quem diz: será sangue, mas o tempo é dinheiro.
Também na rua dos Cavaleiros se via uma legenda semelhante
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De comer
pedir
pagar
e andar
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no género da que hoje vemos em quatro insígnias salientes num estabelecimento de artigos eléctricos da Baixa
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Sede benvindos
Não hesiteis
Temos de tudo
Agradecidos
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Outros letreiros valém uma transcrição.
Ao Poço do Bispo:
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Vinho sem ser de oudre (!)
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na rua de Boaventura:
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Bella cousa he beber vinho
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Na Calçada da Estrela:
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Armazém sem contracção
Comerese agurdente.
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Quem se contraíu foi o pintor, que teve de comer sílabas e letras.
Perdoemos-lhe todos"
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Voltarei a este assunto.
Saudações.

1 comentário:

  1. Nesta foto da sessão de hoje, véspera do glorioso dia em que tentaram impedir o acesso à Adega Amável, só não consigo reconhecer o Grosso. Não lhe vejo a careca.......

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